Editorial: Por que o anúncio de uma possível exportação de algodão para a China não convence parte da população de Pau dos Ferros?


A assessoria de comunicação da prefeita de Pau dos Ferros, Marianna Almeida (PSD), anunciou, após missão oficial à China, o início das articulações para exportar o óleo da semente de algodão local, destacando a empresa Torta de Algodão Frei Damião como peça-chave. A narrativa ganhou destaque nas redes sociais da Prefeitura, que divulgou vídeos e textos institucionais mostrando a gestora, acompanhada de secretários municipais e representantes da Emater, em visita à referida empresa.

Uma parcela significativa da população recebe a narrativa institucional com dúvidas, sobretudo quanto à real capacidade de gerar novos empregos e renda em grande escala. Está claro que a empresa Torta de Algodão Frei Damião já operava no município antes da viagem. A interpretação de que a visita à fábrica, logo no retorno, foi utilizada para associar a missão internacional a um ativo local já consolidado tem sido amplamente debatida.

Essa suposta estratégia midiática intensifica o questionamento sobre o que a viagem realmente concretizou: trata-se de um acordo comercial documentado ou apenas de uma apresentação de potencial?  Inclusive, o anúncio coincide com a necessidade da gestão de justificar o gasto de R$ 20 mil em diárias (valor total) para a missão na China. 

A produção de algodão (cotonicultura) na região de Pau dos Ferros, embora histórica, hoje se baseia principalmente em projetos de incentivo ao Algodão Agroecológico, que, apesar de sustentáveis, envolvem um número limitado de produtores e  que operam em escala significativamente menor, com um desafio notável para retomar os grandes volumes do passado.

Ademais, a ambição de exportar exige uma análise que vá além do discurso. É fundamental reconhecer o potencial inegável da Torta de Algodão Frei Damião como um núcleo industrial promissor na região do Alto Oeste Potiguar. Contudo, o compromisso com a verdade impõe que a gestão municipal transforme a fase de "articulação" em resultados concretos. 

O leitor e a população de Pau dos Ferros precisam de evidências fáticas (contratos ou documentos que atestem o volume de investimento e a demanda real do mercado chinês) para que o otimismo se traduza em desenvolvimento econômico efetivo e sustentável, e não seja apenas percebido como um instrumento de promoção institucional desenhado para justificar os gastos públicos da recente viagem.